Confira a íntegra do discurso do presidente do CFOAB, Felipe Santa Cruz, durante sessão solene de posse da Seccional Catarinense.

Em discurso enérgico, o presidente nacional da OAB, Felipe Santa Cruz, deu as boas vindas às diretorias e conselhos da OAB/SC e CAA/SC, que assumiram o Sistema OAB Catarinense para o triênio 2019/2021.  A cerimônia, que lotou a Associação Catarinense de Medicina, ocorreu na noite de quinta-feira (14), em Florianópolis. Na ocasião, também foram empossados os 49 presidentes das Subseções da Ordem catarinense.

Em sua fala, Santa Cruz lembrou o compromisso social da Advocacia, prestou homenagens aos eleitos e ainda salientou a importância do apoio da instituição à representatividade feminina na OAB. A Seccional catarinense é uma das únicas no País a cumprir com o regulamento de contar com pelo menos 30% de mulheres nos cargos eletivos.

Confira a íntegra do discurso:

Talvez a ideia do Presidente do Conselho Federal falar no começo e no fim de a sessão, talvez seja para salvar o presidente do já que tudo já foi dito. Dito com com emoção, com cerimônia, com brilhantismo, com compaixão, com serenidade e com simpatia.

Quero dizer a todos os colegas de Santa Catarina que nos últimos sete dias fomos a todos os cantos do país. Cruzei o Brasil. Fomos ao Nordeste, Centro-Oeste… Dias de posses.

E, eu tenho uma boa notícia a dar a todos aqui: A  nossa entidade, em tempos de WhatsApp, de redes sociais, de afastamento, onde as pessoas às vezes preferem dialogar através da tela do computador, continua forte e organizada em todo país.

Em todos esses lugares que eu aqui falei, em todas essas regiões, eu encontrei solenidades como essa. Com 1000 advogados, 1500 advogados ou em estado pequenos com 700 advogados, a noite, sentados, ouvindo discursos. Uma dinâmica que é da nossa profissão. É das nossas tradições.

A Ordem, então, continua forte em todo Brasil e a natural que ela seja, no momento agudo de debates, uma espécie de catedral, de santuário, onde nós somos capazes de discutir os problemas da nossa profissão e do nosso país.

Eu quero, antes de mais nada,  pedir uma salva de palmas a vocês os advogados e advogadas de Santa Catarina.

Serei muito breve. E vou pedir desculpas aos meus amigos Paulo Brincas e Rafael Horn.

Brincas porque fez aqui um discurso de despedida quando nós não vamos deixá-lo ir a lugar nenhum. Foi um discurso apaixonado que nos transmitiu o que nos une.

Eu também desde criança tive minha vida profissional protegida pela Ordem dos Advogados.

Sempre sonhei em dar algo de volta à Ordem dos Advogados.

Confesso que, nem em meu maior sonho, esperava chegar aos 46 anos de idade, depois de ter sido presidente da Caixa de Assistência na minha Seccional; diretor de subseção por duas vezes; e presidente da segunda maior Seccional do Brasil; eu não esperava chegar à Ordem na presidência do Conselho Federal, em chapa única.

Também não tenho vaidade com isso. Compreendo como Brincas a dureza do cargo. E, a vontade que manifesto aqui é a de não ser porta-voz da minha voz, mas porta-voz da voz de um milhão de advogados que se espalham pelo Brasil, pensam de forma heterogênea, mas, têm todos eles princípios únicos que são como guias, como nortes da nossa profissão.

Sobre o Rafael, eu não preciso nem dizer. Ele disse tudo aqui da Tribuna. Sólido, educado profundo, culto… Rafael tem esse brilho. A gente, no Conselho Federal, tem um olhar clínico. Nós olhamos, às vezes, muitos anos antes aquele que sabemos que vai longe na sua Seccional; que tem algo de grande a doar para Ordem de todo Brasil.

Rafael sempre teve isso. É natural dele. Em todas as suas contribuições para a Ordem, e

costumo repetir a fala do presidente, Seabra Fagundes, ‘Não há nenhum trabalho pequeno para um homem e ou mulher de OAB. Todo trabalho é uma avenida para servir os seus colegas. E, um bom colega, aquele que serve com paixão a classe, é sempre reconhecido.

O teu reconhecimento Rafael, nessa noite inesquecível para todos nós, tenho certeza que é fruto de muito suor, de muita aplicação, de muita renúncia.

Renúncia não só tua, mas da tua família, da tua esposa. E, eles merecem de todos os nós, o agradecimento e a nossa salva de palmas.

Peço desculpa aos dois, pois vou citar e vou abraçar as autoridades e os nossos amigos que nos honram nesta solenidade, na pessoa de quatro mulheres.

Recentemente, entre as muitas falsas polêmicas que o Brasil produz, tivemos uma discussão sobre o papel da mulher na direção da Ordem dos Advogados.

Eu digo que a grande discussão desse país é o papel da mulher em toda a sociedade, em todos os espaços de poder e não só na Ordem dos Advogados.

A Ordem tem se dedicado nos últimos anos, de forma ferrenha e abnegada, por conta das mulheres a ampliar esses espaços

Não é algo dado. É algo conquistado.  

É óbvio que isso esbarra em uma transformação cultural. É óbvio que isso esbarra numa transformação que deve ser muito mais célere.

Dou o exemplo da minha casa: Eu virei Conselheiro Seccional pela primeira vez em janeiro de 2007. Eu estava no Conselho ao lado da minha esposa, também Conselheira Seccional quem em tudo é melhor do que eu.

Passou em três posições à frente no vestibular; terminou o doutorado primeiro que eu; tem livros publicados; é melhor cuidando da família…

Em dado momento, tivemos que fazer uma escolha. O ambiente de Ordem, em dado momento, diante dos filhos e de uma série de desafios e do escritório, obrigou a Daniela a não ficar mais naquela vida de Ordem.

Por isso, eu penso que cada mulher que vence na OAB deve ser celebrada.

Na minha Ordem, muito tempo se fez política em mesas de bar que excluíam as mulheres.

Celebrar essas mulheres, é celebrar a mudança cultural que elas representam.

Quero dizer a doutora Cláudia Prudêncio que essa mudança cultural é assim também parte dos homens que apoiam o sonho das mulheres.

Então quero cumprimentar advocacia nas pessoas de Cláudia Prudêncio, Sandra Krieger e Maria de Lourdes Zimath e também da vice-governadora, que ocupa um espaço tão importante no Estado de Santa Catarina.

Quero dizer a Cláudia que me comovi. Fui presidente de Caixa e me comovi com as tuas palavras. Pois advogar e cuidar da ordem é cuidar do advogado. E, nós temos, na advocacia hoje, uma massa enorme de colegas que precisam de nós.

Quem ingressam na profissão, muitas vezes, sem esperança. Ingressam na profissão, muitas vezes, sem espaço para advogar. Ingressam na profissão, muitas vezes, precisando da Ordem para dar os primeiros passos para que, aí sim, o seu talento os leve adiante.

Esse é o papel da Caixa. Também é papel da Caixa amparar aquele que caiu na vida, em algum momento, e que precisa da ajuda da classe como um todo.  Aquele que está no momento de doença ou está precisando das nossa assistência social.

A Caixa dos Advogados têm que perseverar nessa dura missão. É uma missão dura porque nosso corpo de advogados é enorme e nossos meios são limitados.

Mas, também tenho certeza, que, feito com a paixão que a senhora representou nesta tribuna, que será um sucesso.

Também quero dizer a nossa querida Sandra krieger que eu tenho muito orgulho de na sua pessoa abraçar o Conselho Federal de Santa Catarina.  A nossa querida Sandra está tão disputada no Conselho Federal que eles brigam para decidir para onde ela vai. Se vai para o CNJ, ou CNP. É um talento que se destaca no nosso Conselho Federal e que quero agradecer a tua contribuição.

Por último, deixei a doutora Maria de Lourdes, quem eu não conheço porque é presidente de Subseção. Quando a senhora entrou aqui, eu ouvi de três pessoas que são muito justas, que a senhora é um talento, uma grande presidente e uma grande liderança.

Quero dar uma outra notícia aqui em Santa Catarina: Por onde andei essa mudança cultural do espaço das mulheres só faz avançar. A prova disso é o número de presidentes de subseções que nós temos nesse último mandato. Por exemplo, no Rio Grande do Norte todas as subseções são presididas por colegas mulheres. Isso mostra que nós estamos avançando rapidamente.

Aproveito aqui para fazer um destaque especial aos presidentes de Subseções.

Eu digo que o presidente do Conselho Federal tem as suas dificuldades, enfrenta algumas tempestade, bem como a diretoria e o presidente da Seccional. Mas, para mim que comecei nesse espaço sendo diretor de Subseções da minha seccional, ninguém representa melhor o espírito de Ordem do que o presidente de Subseção.

Não sei se todos compreendem a dureza dessa tarefa.

Às vezes, em uma pequena comarca, os colegas elogiam determinada autoridade na frente da autoridade e cobram do presidente de Subseção que corrija determinado comportamento ou determinado problema.

Um presidente de Subseção é uma espécie de pára-raio de problemas. É a frente, é a vanguarda da nossa tropa.

Já vi muitos, em minha carreira, terem a sua advocacia prejudicada por aceitar esse ônus de forma corajosa e independente.

Quanto menor a comarca, maior a coragem de quem lidera as nossas Subseções.

Por fim, senhora vice-governadora, eu quero me encaminhar ao final com uma palavra que a senhora falou aqui. Quero dizer a palavra harmonia, a palavra que é compromisso da advocacia.

Eu tenho refletido, muito, nas últimas semanas, sobre as dificuldades do nosso tempo.

Nós vivemos um tempo aonde se corre para classificar e categorizar o outro. Vivemos um tempo aonde há uma pressa violenta e indevida em afastar qualquer pensamento que frustre uma visão minha de mundo.

Claro que eu entendo a razão disso.

Vivemos uma profunda crise econômica, uma crise moral, uma dificuldade enorme pós redemocratização com a frustração e a traição de partes substanciais das lideranças políticas do nosso país.

Isso trouxe ao nosso povo desesperança.

Mas, todos nós, advogados, sabemos que não há como comparar esse tempo de instituições funcionando,Tribunais e Ministério Público livres e funcionando, com os tempos do arbítrio e os tempos do silêncio.

Todos nós sabemos que os dramas do Brasil só podem ser enfrentados dentro do Estado democrático de direito, através do fortalecimento da democracia.

Só há uma cura para os problemas da democracia: Mais democracia, mais transparência, mais sol, mais radicalização do processo de convivência.

A Ordem dos Advogados do Brasil, meus colegas, tem um compromisso que não é dela, apenas, é da sua história, mas é também da democracia brasileira.

Foi o modelo da democracia brasileira que nos deu a tarefa de liderar a sociedade civil.

O Brasil passa por algumas das maiores discussões para o seu futuro.

Nós vamos discutir a reforma previdenciária, a reforma tributária, o mais injusto sistema tributário do Ocidente,  um pacote anti-crime – e quem de nós discorda que as nossas cidades estão afundando e insegurança? Ninguém -.

Nós vamos discutir mudanças profundas em legislações que demoraram décadas para serem construídas. Aqui, temos que resgatar a serenidade e a possibilidade de dialogar livremente.

Devemos garantir o livre trânsito das ideias, do que concordamos e do que discordamos. Aqui, a Ordem pode ser a ponte onde alguns querem cavar fosso.

Esse é o desafio que a Ordem tem. Um desafio que a advocacia precisa abraçar nesse momento.

Quando o pensamento único toma conta da democracia, quando o pensamento único que pensa que não há complexidade na solução dos problemas toma conta da democracia, se esvazia o papel do advogado em cada comarca do nosso país.

O que é o advogado senão o porta-voz de um cidadão que precisa de voz, meus colegas?

O que é o advogado senão o porta-voz de um contraditório?

O que é o advogado senão aquele que persegue a produção da prova para que faça ali nascer a verdade dos fatos?

Se, nós esvaziarmos a vida pública brasileira da possibilidade do diálogo, de contraditório, nós vamos esvaziar a própria matriz da nossa profissão.Nós vamos viver um processo aonde a violação às nossas prerrogativas será fruto de algo maior, macro, que é o esvaziamento da possibilidade do debate do contraditório e da busca permanente pela justiça, dentro dessa sociedade.

Então, eu quero aqui, pedir a cada um de vocês: Vamos nos reencontrar!

Vamos fazer da nossa Ordem uma casa de debates!

Vamos discutir de forma corajosa o que tem que ser mudado no nosso país!

Vamos aceitar que esse país precisa resgatar rapidamente a capacidade de dar aos homens com capacidade de produzir, a liberdade para produzir.

Nós precisamos garantir a segurança dos contratos, precisamos garantir a livre iniciativa, precisamos garantir um sistema tributário justo. Porque só aí o nosso povo terá o crescimento econômico.

Nós somos canal para isso através do nosso conhecimento, mas, nosso povo também terá acesso à justiça.

Encerro lembrando um episódio que tenho citado desde a minha posse: Todos, há mais ou menos um ano, concordavam com a necessidade de uma reforma trabalhista.

Poucos resistiram.

Eu dizia ainda que se discuta a possibilidade de uma reforma trabalhista, ela precisa ser feita com profundidade técnica, ouvindo os especialistas, magistrados e advogados.

Agora, no episódio de Brumadinho, a Ordem vai ao supremo porque, simplesmente, se colocou na reforma trabalhista uma taxação do dano, que causa a perversa consequência de a vida de um turista, que infelizmente foi colhido pela tragédia, valha e não tenha limite no seu dano. Mas, a vida de um trabalhador, que carregava pedra na mina, tem um dando limitado a 50 vezes um salário de mil reais.

Como eu posso construir um país, tecnicamente justo, se eu acredito que a vida de um trabalhador tenha um teto de valor e a vida dos outros não? Se é o trabalho é que é emancipa os povos…

Aí que está o nosso valor! É aí que está a nossa discussão!

Claro que nós somos a favor do combate à corrupção;

Claro que somos a favor de toda e qualquer operação que coloque atrás das grades aqueles que furtam e que tomam o dinheiro sofrido do povo brasileiro.

Mas, queremos tudo isso dentro do âmbito da ampla defesa da Constituição.

E, queremos muito mais: queremos um país maior; Um país que rediscuta os espaços institucionais;

Um país que revalorize o executivo, senhora vice-governadora;

Que revalorize o legislativo, senhor presidente da Assembleia Legislativa;

Onde o Judiciário permaneça com a sua missão; o Ministério Público independente; o trabalhador siga com seu trabalho;

E, a advocacia possa, em cada comarca, corajosamente, dar voz a quem não tem, defender quem precisa e fazer o seu papel na defesa que é o papel sagrado da constituição.

Isso é fácil de falar mas é difícil de fazer. Muitas vezes somos confundidos com o pecado do pecador.

Nós, dizia Sobral, odiamos o pecado, mas amamos o pecador;

Nós, advogados, não temos o direito de termos vaidade dos nossos preconceitos. Todo o dia, quando chegamos ao escritório, começamos de novo. Conhecemos o sofrimento e viramos voz desse sofrimento.

Quero dizer ainda, Rafael, que eu fiquei muito feliz nessa noite. Estou muito satisfeito e muito orgulhoso de fazer parte desse momento e de ser tão bem recebido em Santa Catarina. Estou muito orgulhoso de dividir contigo e com a tua direção essa quadra da história que pode ser tão decisiva na história desse país e do povo brasileiro.

Muito Obrigado.

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